Eleição: um ritual incômodo

Por José Ronaldo Dias Campos

Todo processo eletivo, dito democrático, sempre ensina alguma coisa. Nem sempre coisas nobres — às vezes, lições amargas, quase desprezíveis, pela frequente ausência de eticidade, independentemente da natureza do certame.

Quem já viveu outras disputas — como campanhas eleitorais convencionais — leva certa vantagem. Conhece os atalhos, as estratégias, os códigos ocultos. Defende suas cores partidárias, seus interesses (próprios ou de grupo), com a naturalidade de quem já percorreu o campo minado das eleições mais de uma vez.

Eu, por exemplo, levo desvantagem. Nunca me acostumei com esse papel. Tenho vergonha de pedir voto. Sinto-me constrangido, como se estivesse invadindo um espaço íntimo. Não quero importunar ninguém — sobretudo o eleitor, essa figura tão cortejada quanto fugidia.

Mesmo as pessoas conhecidas, por incrível que pareça, costumam exigir o ritual completo: a visita protocolar, a exposição da “plataforma de gestão”, o aperto de mão ensaiado, a promessa velada de reciprocidade futura.

E há ainda os que, talvez encantados com o próprio poder de escolha, dificultam o contato. Tornam-se iníveis. Mostram-se arrogantes, indiferentes — como se o simples ato de ignorar lhes conferisse um poder maior no teatro da eleição.

No fundo, cada eleição é também um espelho. De quem disputa. De quem escolhe. De quem assiste calado. O desconforto que sinto não é fraqueza — talvez seja apenas o sinal de que, por trás do candidato, ainda reside um tímido cidadão, com senso crítico, de proporção e, se me permitem, uma certa fé na civilidade das relações intersubjetivas.

Porque, no fim das contas, quem precisa se vender para se eleger corre o risco de se tornar refém do próprio preço.

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